Alex

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quarta-feira, 20 de junho de 2012

Carta aberta a Dom Demétrio Valentini, bispo de Jales (SP).

Excelência, Sua Benção! Como leigo Católico residente na circunscrição eclesiástica da Diocese de Jales venho respeitosamente tecer alguns comentários que reputo importantes acerca de um dos últimos artigos de Vossa Excelência, intitulado “Pela liberdade de consciência”. No referido texto Vossa Excelência parece reagir aos pronunciamentos de Bispos e Padres, secretarias e institutos religiosos que ultimamente têm conclamado os fiéis católicos a não contribuírem com o voto à candidatura de Dilma Roussef à Presidência da República. Tanto assim que em meio a uma ode à liberdade de consciência Vossa Excelência pontua que se difundem “cartas procedentes de sub-comissões, de sub-regionais, ou cartas individuais de determinados bispos ou padres, e pretendem invocar sobre estes escritos a autoridade de toda a instituição, quando o Presidente da CNBB, D. Geraldo Lyrio Rocha já esclareceu, enfaticamente, que a CNBB não apóia nenhum partido e nenhum candidato, nem igualmente proíbe nenhum partido ou candidato.”, aludindo aos vídeos e textos que se lançaram recentemente, como o de Dom Luiz Gonzaga Bergonzini, Dom Alberto Taveira Correia, Dom Manoel Pestana, ou a nota da Comissão Episcopal representativa do Conselho Episcopal Regional Sul 1 da CNBB entre outros nobilíssimos Bispos e Padres. Pode-se confirmar que o intento era mesmo o de defender mais especialmente a legitimidade de voto em Dilma Roussef observando o texto seguinte, publicado alguns dias depois no mesmo site da Diocese, em que se lê sob o título “o fato relevante” que, entre outras coisas “Esta autonomia frente à grande imprensa, se traduz também em liberdade diante das recomendações de ordem autoritária. Elas também já não influenciam. Ao contrário, parecem produzir efeito contrário. Quando (sic) mais o bispo insiste, mais o povo vota contra a opinião do bispo.”. Diante de tudo isso, sinto-me no dever moral de lançar algumas ponderações atinentes ao assunto, o que faço primeiramente a Vossa Excelência, mas também a tantos mais quantos tiverem lido os supracitados artigos, daí esta carta aberta. O dever de todo católico de colaborar – conforme suas condições e estado de vida – ao Bem Comum na Polis é algo deveras relevante, e em vista de que “a Graça não destrói, mas aperfeiçoa a natureza[1]”, esse mesmo católico encontra na Sã Doutrina e na disciplina da Igreja uma apurada e renovada força para cumprir com seus deveres de cidadania, bem como fazer valer seus direitos. Assim é que, os problemas de ordem natural em crivo político e econômico, enquanto estão sob aspectos técnicos, carregam consigo uma maior liberdade decisória quanto a maneira de resolvê-los. Entretanto, a face política dos problemas de ordem natural pode ter, e regularmente têm, um outro aspecto além do meramente técnico, trata-se do sobressalente aspecto moral, sobre o qual deve a Igreja instruir os fiéis, como múnus próprio entregue por Cristo aos Apóstolos e seus sucessores. Por isso é que se lê na Encíclica Immortale Dei, de Leão XIII, a explicitação do que sempre fora crido: “Destarte, tudo o que, nas coisas humanas, é de certo modo sagrado, tudo o que pertence à salvação das almas ou ao culto de Deus, que seja assim por natureza própria ou, ao invés, se entenda como tal pela causa a que se refere, tudo isso abrange do poder e arbítrio da Igreja” (Denzinger-Hunermann, 2007, p. 678). É ainda mais clara a Instrução Libertatis conscientia (título bem a calhar ao assunto em pauta), que sob o reinado do Papa João Paulo II e retomando as grandes chaves de leitura da Doutrina Social da Igreja, asseverou: “Nesta missão, a Igreja ensina o caminho que o homem deve seguir neste mundo para entrar no Reino de Deus. Por isso, sua Doutrina abarca toda ordem moral e, particularmente, a justiça, que deve regular as relações humanas. [...] Quando propõe sua doutrina acerca da promoção da justiça na sociedade humana ou exorta os leigos ao engajamento, segundo sua vocação, a Igreja não excede seus limites [...] Na mesma linha, a Igreja é fiel à sua missão, quando denuncia os desvios, as servidões e as opressões de que os homens são vítimas; quando se opõe às tentativas de instaurar, seja por oposição consciente, seja por negligência culposa, uma vida social da qual Deus esteja ausente, enfim, quando exerce seu julgamento a respeito de movimentos políticos que pretendem lutar contra a miséria e a opressão, mas são contaminados por teorias e métodos de ação contrários ao Evangelho e ao próprio ser humano.” (Idem, p. 1122) Ora, o pedido de muitos Bispos e Padres para que os fiéis não incidam no erro de votar em candidatos que, pessoalmente ou por força do partido, defendam a legalização do aborto é totalmente justificado pela própria hediondez do crime que não pode ter chancela governamental sem grave prejuízo a toda a nação. O partido dos trabalhadores conseguiu evidente destaque negativo nessa seara ao encaminhar, em 2004, um relatório ao Comitê de Direitos Humanos da ONU que afirma o compromisso do governo do PT na luta em “revisar a legislação repressiva” contrária ao aborto no Brasil; o governo Lula, publica ainda em 2004, o plano nacional de políticas para mulheres, em que apresentava como algo de ação prioritária no item 36.1 do referido documento “revisar a legislação punitiva” do aborto, tais diretrizes conforme os dizeres do próprio documento oficial foram aprovados pelos ministros de estado e pelo presidente da República; em seguida, o governo por meio de sua base parlamentar na câmara dos deputados, lutou pela aprovação do projeto de lei nº 1135/91, de autoria dos ex deputados petistas Eduardo Jorge e Sandra Starling, que liberaria o aborto no país a ser financiado pelo governo com o dinheiro dos impostos, através do sistema único de saúde, e sem qualquer restrição; a rejeição do projeto de lei retro indicado ocorreu somente em 9 de julho de 2008 com parecer em contrário da Comissão de Constituição e Justiça, entretanto, para que não houvesse o arquivamento do mesmo, o deputado do PT José Genoíno apresentou o recurso 201/2008 solicitando a liberação do projeto para ser votado em plenário, apesar dos pareceres contrários de duas comissões internas da câmara, assim o deputado pretende que o projeto seja aprovado no momento oportuno, o que vale dizer, depois de manobras e visível maioria com mínimo legalmente possível de quorum. Agora, o mais aviltante ainda está por vir: em 21 de dezembro de 2009, o governo Lula sanciona o Plano Nacional de Direitos Humanos, que apresenta como objetivo estratégico (item III) o apoio à aprovação de projeto de lei que descriminalize o aborto, além de defender projetos que equiparem ao casamento a união homossexual e propostas de retirada obrigatória de todos os símbolos religiosos de qualquer repartição pública. Isso também é reafirmado em 22 de fevereiro de 2010, em que o site oficial do PT publica a Resolução sobre as diretrizes de programa 2011 a 2014 (portanto a ser implantada com a eleição de Dilma Roussef, o apoio ao aborto é especialmente citado na diretriz nº 57 do documento). Em 16 de Julho de 2010, um ministro e uma chefe de secretaria do governo, e “companheiros” de Dilma Roussef, assinaram em nome do Estado Brasileiro o denominado “Consenso de Brasília”, em que se assume o compromisso pela legalização do aborto (item 6, alínea f). Dilma Roussef, em recente entrevista filmada aos editores da revista “istoé” (que pode ser vista na íntegra quanto ao tema, até mesmo pelo youtube), se reportou ao aborto dizendo que o fato negativo do mesmo é apenas o de provocar dores na mulher, disse ela: “além de ser uma agressão ao corpo da mulher, dói… eu imagino que a mulher sai de lá baqueada (sic)”, nenhuma palavra fora dita sobre o sofrimento e morte da criança no ventre, o que, além de tudo, mostra uma cruel insensibilidade. O fato emblemático, entretanto, é outro, pois “nunca antes na história desse país”, deputados tinham sido perseguidos e forçados a sair de um partido mediante processo disciplinar, por terem se mostrado contrários à legalização do aborto. Foi talvez uma das maiores façanhas ocorridas durante o governo petista: os deputados federais Luiz Bassuma e Henrique Fontes sofreram processo disciplinar no PT e foram punidos pelo partido por serem contrários à legalização do aborto! (de fato, o PT não é lugar para pró-vida). Isso fora possível, pois, no PT o aborto é programa de partido e fora institucionalizado como meta em Congresso Nacional partidário (definida a legalização do aborto a ser realizado nos hospitais públicos sem restrições, pelo III Congresso Nacional do PT, em 2007, entre outros anteriores e com confirmação posterior do Congresso de número IV, de 2009). Tendo diante de si todas essas amostras de desrespeito ao bem natural mais fundamental que é a vida, em vista ainda da pretensão do PT de que esse bem mais fundamental possa ser diretamente atacado e tolhido através do aborto financiado pelo Estado via SUS, os religiosos conscientes e zelosos de seu dever opuseram-se a tal plano que “clama aos céus por vingança” conclamando os católicos a não contribuírem nessa tenebrosa empreitada. Pois quem colabora com o pecado, mesmo por omissão, é réu da mesma culpa e prestará contas a Deus, assim ensina o Catecismo da Igreja. Muito claramente expressa essa lição do catecismo o Padre Marcelo Tenório: “colaborar com o pecado grave, nem que seja por omissão é comete-lo também. O aborto é pecado grave que brada aos céus por justiça. Votar em qualquer candidato que o apóia é ser réu diante de Deus, é ficar com as mãos sujas do sangue dos inocentes que será derramado mais ainda se esta lei iníqua um dia for aprovada.”[2] Afinal, se lê na Lumen Gentium que tanto os clérigos quanto os leigos, por óbvio, “se devem guiar em todas as coisas temporais pela consciência cristã, já que nenhuma atividade humana, nem mesmo em assuntos temporais, se pode subtrair ao Domínio de Deus.” (Idem, p. 958. parágrafo 36 do doc.). Para atacar os prelados que atacaram o PT, Vossa Excelência repetidamente lançou mão em seu texto da expressão “liberdade de consciência” – com a qual, segundo Vossa Excelência, os católicos poderiam votar sem receio em Dilma Roussef. Ocorre que a liberdade de consciência que Vossa Excelência evoca não se parece nesse ínterim com a sã liberdade católica, pois verdadeira liberdade não é aquela que se satisfaz em ser livre, mas sim aquela que se vale do ser livre para abraçar e prover a Verdade e o Bem. Ou, noutras palavras, não se trata de obnubilar a consciência para usá-la de maneira contrária ao Bem sob a bandeira da liberdade, a isso melhor seria chamar libertinagem ou arbitrariedade. A liberdade é um bem, mas é um bem “meio”, e não um bem “fim” em si mesmo, ela deve estar a serviço da Verdade e do fim último do ser humano, Este sim Bem Absoluto, Deus mesmo. Vale mais uma citação de Leão XIII, o grande Papa da Doutrina Social da Igreja, dessa vez na Encíclica Libertas Praestantissimum: “Em conseqüência disso, numa verdadeira sociedade humana, a liberdade não consiste em cada um fazer o que bem entende,… mas nisto, que, por meio das leis civis, se possa viver mais facilmente de acordo com as prescrições da Lei Eterna.” (Ibidem, p. 691). Do contrário a liberdade se torna auto destrutiva e destruidora de seu fundamento terreno participado, o ser humano. Desta forma a liberdade não tem a prerrogativa de tudo legitimar, nem foros absolutos. Diga-se ainda que, nenhum dos clérigos que apontaram o dever moral do católico de não contribuir com a legalização do aborto, irá porventura coagi-los ou obriga-los por intermédio da força, isso sequer é factível no sistema de voto secreto e muito menos fora esse o intento que manifestaram os reverendíssimos religiosos, eles apenas alertaram sobre o grave problema ético que envolve a questão. De fato, a possibilidade de votar em partidos pró-aborto se mantém, por isso mesmo é que devemos reafirmar ao católico que não deve anuir nesse projeto contra a vida, ou seja, o dever de não votar nesses partidos é decorrência lógica da posição católica contra o aborto, é dever por coerência cristã… não uma obrigação imposta por armas e avessa ao exercício da liberdade de consciência, mas se trata exatamente de fomentar o uso consciencioso da liberdade de maneira autenticamente cristã. Por tudo isso é que o católico não deve votar no PT e em políticos pessoalmente favoráveis ao aborto, pois o tema atinge o bem natural maior – que é a vida – daqueles mais indefesos, os nascituros. Defender posição em sentido contrário e votar em candidatos legalizadores do aborto é se tornar ipso factum cúmplice (seja em maior ou menor grau) do assassinato de inocentes por nascer, pois a Santa Igreja Católica Apostólica Romana sempre proibiu o aborto e isso pode ser atestado historiograficamente já pelos documentos patrísticos. Desde o 1º Catecismo Cristão (Didaché) que data do ano 90-100, está escrito ‘não matarás criança por aborto, nem criança já nascida’ [...] Em 220, Tertuliano diz uma frase genial: ‘É homem o que deve tornar-se homem, tal como o fruto inteiro está contido na semente’ (apologética, cap.9)[3]. A condenação foi reafirmada em vários Concílios no correr dos séculos: Concílio de Ancara (ano 314, cânone 20); Concílio de Lérida (ano 524, cânone 2); Concílio de Constantinopla (ano 629, cânone 91); Concílio de Worms (ano 829, cânone 35). Também através de Bulas: Ephenatom (ano 1588), Sedes Apostólica, do Papa Gregório XIV (ano 1591) e Sedes Apostólica do Papa Pio IX (ano 1869) e assim, sempre, no exercício Perene do Magistério Eclesial[4]. _____ De quem lhe agradece imensamente por ter ministrado meu Sacramento da Crisma, cuja Graça Divina comunicada me fez – ainda que muito pecador – um soldado do Senhor dos Exércitos, subscrevo-me suplicando que reveja vossa posição acerca do que escrevera. Ad Maiorem Dei Gloriam. Diogo Ferreira. ________________________________________ [1] AQUINO, Santo Tomás. Summa Theologica, I, q. I, art. 8, ad. 2. [2] Retirado de http://www.acidigital.com/noticia.php?id=20210 [3] MARTINS, Roberto Vidal da Silva. Aborto no direito comparado: uma reflexão crítica. In: A vida dos direitos humanos: bioética médica e jurídica.1999 p.409. [4] Idem. p.409 e 410. http://fratresinunum.com/2010/10/04/carta-aberta-a-dom-demetrio-valentini-bispo-diocesano-de-jales-sp/

terça-feira, 12 de junho de 2012

EU VOS EXPLICO A TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO - Card. Joseph Ratzinger

Por Card. Joseph Ratzinger


Tradução: d. Estêvão Bettencourt


Para esclarecer a minha tarefa e a minha intenção, com relação ao tema, parecem-me necessárias algumas observações preliminares:


1. A teologia da libertação é fenômeno extraordinariamente complexo. É possível formar-se um conceito da teologia da libertação segundo o qual ela vai das posições mais radicalmente marxistas até aquelas que propõem o lugar apropriado da necessária responsabilidade do cristão para com os pobres e os oprimidos no contexto de uma correta teologia eclesial, como fizeram os documentos do CELAM, de Medellin a Puebla. Neste nosso texto, usaremos o conceito “teologia da libertação” em sentido mais restrito: sentido que compreende apenas aqueles teólogos que, de algum modo, fizeram própria a opção fundamental marxista. Mesmo aqui existem, nos particulares, muitas diferenças que é impossível aprofundar nesta reflexão geral. Neste contexto posso apenas tentar pôr em evidência algumas linhas fundamentais que, sem desconhecer as diversas matrizes, são muito difundidas e exercem certa influência mesmo onde não existe teologia da libertação em sentido estrito.
2. Com a análise do fenômeno da teologia da libertação torna-se manifesto um perigo fundamental para a fé da Igreja. Sem dúvida, é preciso ter presente que um erro não pode existir se não contém um núcleo de verdade. De fato, um erro é tanto mais perigoso quanto maior for a proporção do núcleo de verdade assumida. Além disso, o erro não se poderia apropriar daquela parte de verdade, se essa verdade fosse suficientemente vivida e testemunhada ali onde é o seu lugar, isto é, na fé da Igreja. Por isso, ao lado da demonstração do erro e do perigo da teologia da libertação, é preciso sempre acrescentar a pergunta: que verdade se esconde no erro e como recupera-la plenamente?
3. A teologia da libertação é um fenômeno universal sob três pontos de vista:
a) Essa teologia não pretende constituir-se como um novo tratado teológico ao lado dos outros já existentes; não pretende, por exemplo, elaborar novos aspectos da ética social da Igreja. Ela se concebe, antes, como uma nova hermenêutica da fé cristã, quer dizer, como nova forma de compreensão e de realização do cristianismo na sua totalidade. Por isto mesmo, muda todas as formas da vida eclesial: a constituição eclesiástica, a liturgia, a catequese, as opções morais;
b) A teologia da libertação tem certamente o seu centro de gravidade na América Latina, mas não é, de modo algum, fenômeno exclusivamente latino-americano. Não se pode pensá-la sem a influência determinante de teólogos europeus e também norte-americanos. Além do mais, existe também na Índia, no Sri Lanka, nas Filipinas, em Taiwan, na África - embora nesta última esteja em primeiro plano a busca de uma “teologia africana”. A união dos teólogos do Terceiro Mundo é fortemente caracterizada pela atenção prestada aos temas da teologia da libertação;
c) A teologia da libertação supera os limites confessionais. Um dos mais conhecidos representantes da teologia da libertação, Hugo Assman, era sacerdote católico e ensina hoje como professor em uma Faculdade protestante, mas continua a se apresentar com o pretensão de estar acima das fronteiras confessionais. A teologia da libertação procura criar, já desde as suas premissas, uma nova universalidade em virtude da qual as separações clássicas da Igreja devem perder a sua Importância.
I. O Conceito de Teologia da Libertação e os Pressupostos de sua Gênese
Essas observações preliminares, entretanto, já nos introduziram no núcleo do tema. Deixam aberta, porém, a questão principal: o que é propriamente o teologia da libertação? Em uma primeira tentativa de resposta, podemos dizer: a teologia da libertação pretende dar nova interpretação global do Cristianismo; explica o Cristianismo como uma práxis de libertação e pretende constituir-se, ela mesma, um guia para tal práxis. Mas assim como, segundo essa teologia, toda realidade é política, também a libertação é um conceito político e o guia rumo à libertação deve ser um guia para a ação política. “Nada resta fora do empenho político. Tudo existe com uma colocação política” (Gutierrez). Uma teologia que não seja “prática (o que significa dizer “essencialmente política”) é considerada “idealista” e condenada como irreal ou como veículo de conservação dos opressores no poder.
Para um teólogo que tenha aprendido a sua teologia na tradição clássica e que tenha aceitado a sua vocação espiritual, é difícil imaginar que seriamente se possa esvaziar a realidade global do Cristianismo em um esquema de práxis sócio-político de libertação. A coisa é, entretanto, mais difícil, já que os teólogos da libertação continuam a usar grande parte da linguagem ascética e dogmática da Igreja em clave nova, de tal modo que aqueles que lêem e que escutam partindo de outra visão, podem ter a impressão de reencontrar o patrimônio antigo com o acréscimo apenas de algumas afirmações um pouco estranhas mas que, unidos a tanta religiosidade, não poderiam ser tão perigosas.
Exatamente a radicalidade da teologia da libertação faz com que a sua gravidade não seja avaliada de modo suficiente; não entra em nenhum esquema de heresia até hoje existente. A sua colocação, já de partida, situa-se fora daquilo que pode ser colhido pelos tradicionais sistemas de discussão. Por isto tentarei abordar a orientação fundamental da teologia da libertação em duas etapas:
Primeiramente é necessário dizer algo acerca dos pressupostos que a tornaram possível; a seguir, desejo aprofundar alguns dos conceitos base que permitem conhecer algo da estrutura da teologia da libertação.
Como se chegou a esta orientação completamente nova do pensamento teológico, que se exprime na teologia da libertação? Vejo principalmente três fatores que a tornaram possível:
1. Após o Concílio [Vaticano II], produziu-se uma situação teológica nova:
a) Surgiu a opinião de que a tradição teológica existente até então não era mais aceitável e, por conseguinte, se deviam procurar, a partir da Escritura e dos sinais dos tempos, orientações teológicas e espirituais totalmente novas;
b) A idéia de abertura ao mundo e de compromisso no mundo transformou-se freqüentemente em uma fé ingênua nas ciências; uma fé que acolheu as ciências humanas como um novo evangelho, sem querer reconhecer os seus limites e problemas próprios. A psicologia, a sociologia e a interpretação marxista da história foram considerados como cientificamente seguras e, a seguir, como instâncias não mais contestáveis do pensamento cristão;
c) A critica da tradição por parte da exegese evangélica moderna, especialmente a de Bultmann e da sua escola, tornou-se uma instância teológica inamovível que barrou a estrada às formas até então válidas da teologia, encorajando assim também novas construções.
2. A situação teológica assim transformada coincidiu com uma situação da historia espiritual também ela modificada. Ao final da fase de reconstrução após a segunda guerra mundial, fase que coincidiu pouco mais ou menos com o término do Concilio, produziu-se no mundo ocidental um sensível vazio de significado, ao qual a filosofia existencialista ainda em voga não estava em condições de dar alguma resposta. Nesta situação, as diferentes formas do neo-marxismo transformaram-se em um impulso moral e, ao mesmo tempo, em uma promessa de significado que parecia quase irresistível à juventude universal. O marxismo, com as acentuações religiosas de Bloch e as filosofias dotadas de rigor científico de Adorno, Harkheimer, Habernas e Marcuse, ofereceram modelos de ação com os quais alguns pensadores acreditavam poder responder ao desafio da miséria no mundo e, ao mesmo tempo, poder atualizar o sentido correto da mensagem bíblica.
3. O desafio moral da pobreza e da opressão não se podia mais ignorar, no momento em que a Europa e a América do Norte atingiam uma opulência até então desconhecida. Este desafio exigia evidentemente nova respostas, que não se podiam encontrar na tradição existente até aquele momento. A situação teológica e filosófica mudada convidava expressamente a buscar o resposta em um cristianismo que se deixasse regular pelos modelos da esperança, aparentemente fundados cientificamente, das filosofias marxistas.
II. A Estrutura Gnoseológica Fundamental do Teologia do Libertação
Esta resposta se apresenta totalmente diversa nas formas particulares de teologia da libertação: teologia da evolução, teologia política, etc. Não pode, pois, ser apresentada globalmente.
Existem, no entanto, alguns conceitos fundamentais que se repetem continuamente nas diferentes variações e exprimem comuns intenções de fundo. Antes de passar aos conceitos fundamentais do conteúdo, é necessário fazer uma observação acerca dos elementos estruturais da teologia da libertação.
Para tal, podemos retomar o que já afirmamos acerca da situação teológica mudada após o Concilio. Como já disse, leu-se a exegese de Bultmann e da sua escola como um enunciado da “ciência” sobre Jesus, ciência que devia obviamente ser considerado como válida. O “Jesus histórico” de Bultmann, entretanto, apresentava-se separado por um abismo (o próprio Bultmann fala de Graben, fosso) do Cristo da fé. Segundo Bultmann, Jesus pertence aos pressupostos do Novo Testamento, permanecendo, porém, encerrado no mundo do judaísmo. O resultado final dessa exegese consistiu em abalar a credibilidade histórica dos Evangelhos: o Cristo da tradição eclesial e o Jesus histórico apresentado pela ciência pertencem evidentemente a dois mundos diferentes. A figura de Jesus foi erradicada da sua colocação na tradição por ação da ciência, considerada como instância suprema; deste modo, por um lado, a tradição pairava como algo de irreal no vazio, e, por outro, devia-se procurar para a figura de Jesus uma nova interpretação e um novo significado.
Bultmann, portanto, adquiriu importância não tanto pelas suas afirmações positivas quanto pelo resultado negativo da sua crítica: o núcleo da fé, a cristologia, permaneceu aberto a novas interpretações porque os seus enunciados originais tinham desaparecido, na medida em que eram considerados historicamente insustentáveis. Ao mesmo tempo desautorizava-se o magistério da Igreja, na medida em que o consideravam preso a uma teoria cientificamente insustentável e, portanto, sem valor como instância cognoscitiva sobre Jesus. Os seus anunciados podiam ser considerados somente como definições frustadas de uma posição cientificamente superada.
Além disso, Bultmann foi importante para o desenvolvimento posterior de uma segunda palavra-chave. Ele trouxe à moda o antigo conceito de hermenêutica, conferindo-lhe uma dinâmica nova. Na palavra “hermenêutica” encontra expressão a idéia de que uma compreensão real dos textos históricos não acontece através de uma mera interpretação histórica; mas toda interpretação histórica inclui certas decisões preliminares. A hermenêutica tem a função de “atualizar”, em conexão com a determinação de dado histórico. Nela, segundo o terminologia clássica, se trata de um “fusão dos horizontes” entre “então” [“naquele tempo”] e o “hoje”. Por conseguinte, ela suscita a pergunta: o que significa o então (“naquele tempo”) nos dias de hoje?
O próprio Bultmann respondeu a esta pergunta servindo-se da filosofia de Heidegger e interpretou, deste modo, a Bíblia em sentido existencialista. Tal resposta, hoje, não apresenta mais algum interesse; neste sentido Bultmann foi superado pela exegese atual. Mas permaneceu a separação entre a figura de Jesus da tradição clássica e a idéia de que se pode e se deve transferir essa figura ao presente, através de uma nova hermenêutica.
A este ponto, surge o segundo elemento, já mencionado, da nossa situação: o novo clima filosófico dos anos sessenta. A análise marxista do história e da sociedade foi considerada, nesse ínterim, como a única dotada de caráter “cientifico”, isto significa que o mundo é interpretado à luz do esquema da luta de classes e que a única escolha possível é entre capitalismo e marxismo. Significa, além disso, que toda a realidade é política e que deve ser justificada politicamente.
O conceito bíblico do “pobre” oferece o ponto de partida para a confusão entre a imagem bíblica da história e a dialética marxista; esse conceito é interpretado com a idéia de proletariado em sentido marxista e justifica também o marxismo como hermenêutica legitima para a compreensão da Bíblia. Ora, Segundo essa compreensão, existem, e só podem existir, duas opções; por isso, contradizer essa interpretação da Bíblia não é senão expressão do esforço da classe dominante para conservar o próprio poder. Gutierrez afirma: “A luta de classes é um dado de fato e a neutralidade acerca desse ponto é absolutamente impossível”. A partir dai, torna-se impossível até a intervenção do magistério eclesiástico: no caso em que este se opusesse a tal interpretação do Cristianismo demonstraria apenas estar ao lado dos ricos e dos dominadores e contra os pobres e os sofredores, isto é, contra o próprio Jesus, e, na dialética da história, aliar-se-ia à parte negativa.
Essa decisão, aparentemente “científica” e “hermeneuticamente” indiscutível, determina por si o rumo da ulterior interpretação do Cristianismo, seja quanto às instancias interpretativas, seja quanto aos conteúdos interpretados.
No que diz respeito as instâncias interpretativas, os conceitos decisivos são: povo, comunidade, experiência, história. Se até então a Igreja, isto é, a Igreja Católica na Sua totalidade, que, transcendendo tempo e espaço, abrange os leigos (sensus fidei) e a hierarquia (magistério), fora a instância hermenêutica fundamental, hoje tornou-se a “comunidade” tal instância. A vivência e as experiências da comunidade determinam agora a compreensão e a interpretação da Escritura.
De novo pode-se dizer, aparentemente de maneira muito científica, que a figura de Jesus, apresentada nos Evangelhos, constitui uma síntese de acontecimentos e interpretações da experiência de comunidades particulares, onde no entanto a interpretação é muito mais importante do que o acontecimento, que, em si, não é mais determinável.
Essa síntese original de acontecimento e interpretação pode ser dissolvida e reconstruída sempre de novo: a comunidade “interpreta” com a sua “experiência” os acontecimentos e encontra assim sua “práxis”. Esta idéia, podemos encontra-la em modo um tanto diverso do conceito de povo, com o qual se transformou a acentuação conciliar da idéia de “povo de Deus” em mito marxista. As experiências do “povo” explicam a Escritura. “Povo” torna-se assim um conceito oposto ao de “hierarquia” e em antítese a todas as instituições indicadas como forças da opressão.
Afinal, é “povo” quem participa da “luta de classes”; a “igreja popular” acontece em oposição à Igreja hierárquica. Por fim, o conceito de “história” torna-se instância hermenêutica decisiva. A opinião, considerada cientificamente segura e irrefutável, de que a Bíblia raciocine em termos exclusivamente de história da salvação, e portanto de maneira anti-metafísica, permite a fusão do horizonte bíblico com a idéia marxista da história que procede dialeticamente como autêntica portadora de salvação; a história é a autêntica revelação e, portanto, a verdadeira instância hermenêutica da interpretação bíblica.
Tal dialética é apoiada, algumas vezes, pela pneumatologia. Em todo caso, também esta última, no magistério que insiste em verdades permanentes, vê uma instância inimiga do progresso, dado que pensa “metafisicamente” e assim contradiz a “história”. Pode-se dizer que o conceito de história absorve o conceito de Deus e de revelação. A “historicidade” da Bíblia deve justificar o seu papel absolutamente predominante e, portanto, deve legitimar, ao mesmo tempo, a passagem para a filosofia materialista-marxista, na qual a história assumiu a função de Deus.
III. Conceitos Fundamentais da Teologia da Libertação
Com isto, chegamos aos conceitos fundamentais do conteúdo da nova interpretação do Cristianismo. Uma vez que os contextos nos quais aparecem os diversos conceitos são diferentes, gostaria de citar alguns deles, sem a pretensão de esquematiza-los.
Comecemos pela nova interpretação da fé, da esperança e da caridade. Com relação a fé, por exemplo, J. Sobrinho afirma: a experiência que Jesus tem de Deus é radicalmente histórica. “A sua fé converte-se em fidelidade”. Por isso Sobrinho substitui fundamentalmente a fé pela “fidelidade à história” (fidelidad a la historia, 143-144). Jesus é fiel à profunda convicção de que o mistério da vida do homem … é realmente o último … (144). Aqui produz-se aquela fusão entre Deus e história que dá a Sobrinho a possibilidade de conservar para Jesus a fórmula de Calcedônia, ainda que com um sentido completamente mudado; pode-se ver como os critérios clássicos da ortodoxia não são aplicáveis à análise dessa teologia, Ignacio Ellacuria, na capa do livro sobre este assunto, afirma: Sobrinho “diz de novo … que Jesus é Deus, acrescentando, porém, imediatamente, que o Deus verdadeiro é somente aquele que se revela historicamente em Jesus e nos pobres, que continuam a sua presença. Somente quem mantém unidas essas duas afirmações, é ortodoxo …“.
A esperança é interpretada como “confiança no futuro” e como trabalho pelo futuro; com isso ela é subordinada novamente ao predomínio da história das classes.
“Amor” consiste na “opção pelos pobres”, isto é, coincide com a opção pela luta de classes.
Os teólogos da libertação sublinham com força, diante do “falso universalismo”, a parcialidade e o caráter partidário da opção cristã; tomar partido é, segundo eles, requisito fundamental de uma correta hermenêutica dos testemunhos bíblicos. Na minha opinião, aqui se pode reconhecer muito claramente a mistura entre uma verdade fundamental do Cristianismo e uma opção fundamental não cristã, que torna o conjunto tão sedutor: o sermão da montanha é, na verdade, a escolha por parte de Deus a favor dos pobres. Mas a interpretação dos pobres no sentido da dialética marxista da história e a interpretação da escolha partidária no sentido da luta de classes é um salto “eis allo genos” (grego: para outro gênero), no qual as coisas contrarias se apresentam como idênticas.
O conceito fundamental da pregação de Jesus é o de “reino de Deus”. Este conceito encontra-se também no centro das teologia da libertação, lido porém no contexto da hermenêutica marxista. Segundo J. Sobrinho, o reino não deve ser compreendido espiritualmente, nem universalmente, no sentido de uma reserva escatologicamente abstrata. Deve ser compreendido em forma partidária e voltado para a práxis. Somente a partir da práxis de Jesus, e não teoricamente, é possível definir o que seria o reino: trabalhar na realidade histórica que nos circunda para transformá-la no reino (166).
Aqui ocorre mencionar também uma idéia fundamental de certa teologia pós-conciliar que impulsionou nessa direção. Muitos apregoaram que, segundo o Concílio, se deveriam superar todas as formas de dualismo: o dualismo de corpo e alma, de natural e sobrenatural, de imanência e transcendência, de presente e futuro. Após o desmantelamento desses dualismos, resta apenas a possibilidade de trabalhar por um reino que se realize nesta história e em sua realidade político-econômica.
Mas justamente dessa forma deixou-se de trabalhar pelo homem de hoje e se começou a destruir o presente, a favor de um futuro hipotético: assim produziu-se imediatamente o verdadeiro dualismo.
Neste contexto gostaria de mencionar também a interpretação, impressionante e definitivamente espantosa, que Sobrinho dá da morte e da ressurreição. Antes do mais, ele estabelece, contra as concepções universalistas, que a ressurreição é, em primeiro lugar, uma esperança para aqueles que são crucificados; estes constituem a maioria dos homens: todos aqueles milhões aos quais a injustiça estrutural se impõe como uma lenta crucifixão (176 e seguintes).
O crente, no entanto, participa também do senhorio de Jesus sobre a história, através da edificação do reino, isto é, na luta pela justiça e pela libertação integral, na transformação das estruturas injustas em estruturas mais humanas. Esse senhorio sobre a história é exercitado ao se repetir o gesto de Deus que ressuscita Jesus, isto é, dando novamente vida aos crucificados da história (181). O homem assumiu o gesto de Deus e aqui a transformação total da mensagem bíblica se manifesta de maneira quase trágica, se se pensa em como essa tentativa de imitação de Deus se desenvolveu e se desenvolve ainda.
Gostaria de citar apenas alguns outros conceitos: o êxodo se transforma em uma imagem central da história da salvação; o mistério pascal é entendido como um símbolo revolucionário e, portanto, a Eucaristia é interpretada como uma festa de libertação no sentido de uma esperança político-messiânica e da sua práxis.
A palavra redenção é substituída geralmente por libertação, a qual, por sua vez, é compreendida, no contexto da história e da luta de classes, como processo de libertação que avança, por fim, é fundamental também a acentuação da práxis: a verdade não deve ser compreendido em sentido metafísico; trata-se de “idealismo”. A verdade realiza-se na história e na práxis. A ação é a verdade.
Por conseguinte, também as idéias que se usam para ação, em última instância são intercambiáveis. A única coisa decisiva é a práxis. A práxis torna-se, assim, o única e verdadeira ortodoxia. Desta forma justifica-se um enorme afastamento dos textos bíblicos: a crítica histórica liberta da interpretação tradicional, que aparece como não-científica.
Com relação à tradição, atribui-se importância ao máximo rigor cientifico na linha de Bultmann. Mas os conteúdos da Bíblia, determinados historicamente, não podem, por sua vez, ser vinculantes de modo absoluto. O instrumento para a interpretação não é, em última análise, a pesquisa histórica, mas, sim, a hermenêutica da história, experimentada na comunidade, isto é, nos grupos políticos, sobretudo dado que a maior parte dos próprios conteúdos bíblicos deve ser considerada como produto de tal hermenêutica comunitária.
Quando se tenta fazer um julgamento geral, deve-se dizer que, quando alguém procura compreender as opções fundamentais da teologia da libertação não pode negar que o conjunto contém uma lógica quase incontestável. Com as premissas da critica bíblica e da hermenêutica fundada na experiência, de um lado, e da análise marxista da história, de outro, conseguiu-se criar uma visão de conjunto do cristianismo que parece responder plenamente tanto às exigências da ciência, quanto aos desafios morais dos nossos tempos. E, portanto, impõe-se aos homens de modo imediato o tarefa de fazer do Cristianismo um instrumento da transformação concreta do mundo, o que pareceria uni-lo a todas as forças progressistas da nossa época.
Pode-se, pois, compreender como esta nova interpretação do Cristianismo atraia sempre mais teólogos, sacerdotes e religiosos, especialmente no contexto dos problemas do terceiro mundo. Subtrair-se a ela deve necessariamente aparecer aos olhos deles como uma evasão da realidade, como uma renúncia à razão e à moral.
Porém, de outra parte, quando se pensa o quanto seja radical a interpretação do Cristianismo que dela deriva, torna-se ainda mais urgente o problema do que se possa e se deva fazer frente a ela.
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Comentários de D. Estevão Bettencourt:
À guisa de comentário, parece oportuno salientar os seguintes pontos:
1) A Teologia da Libertação não é um novo tratado teológico ao lado de outros já existentes, mas é uma nova interpretação do Cristianismo, que revira radicalmente as verdades da fé, a constituição da Igreja, a Liturgia, a catequética e as opções morais.
2) Todos os valores e toda a realidade são considerados do ponto de vista político. Uma teologia que não seja essencialmente política, é encarada como fator de conservação dos apressares no poder.
3) A dificuldade de se perceber esse caráter subversiva da Teologia da Libertação está, em grande parte, no fato de que os seus arautos continuam a usar a linguagem ascética e dogmática da Igreja, embora em chave nova. Isto dá aos observadores a impressão de que estão diante do patrimônio da fé acrescido de algumas afirmações religiosas que não podem ser perigosas.
4) A gravidade da Teologia da Libertação não é suficientemente avaliada; não entra em nenhum esquema de heresia até hoje existente.
5) O cristão não pode ser, de forma alguma, insensível à miséria dos povos do Terceiro Mundo. Todavia, para acudir cristãmente a tal situação, não lhe é necessário adotar um sistema de pensamento que é anticristão como a Teologia da Libertação; existe a doutrina social da Igreja, desenvolvida pelos Papas desde Leão XIII até João Paulo II de maneira cada vez mais incisiva e penetrante. Se fosse posta em prática, eliminaria graves males de que sofrem os homens, sem disseminar o ódio e a luta de classes.


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CARD., Joseph Ratzinger. Apostolado Veritatis Splendor: "EU VOS EXPLICO A TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO".
Disponível em http://www.veritatis.com.br/article/4734. Desde 05/05/2008.

Fonte : http://celitogarcia.blogspot.com.br/2010/03/eu-vos-explico-teologia-da-libertacao.html